Há uma semana todos assistimos o episódio ocorrido durante o jogo de
futebol entre as equipes do vasco e do atlético paranaense realizado na
conhecida Arena Joinville na cidade que leva o mesmo nome e válido pelo
campeonato brasileiro da série A.
Resolvi esperar pelo menos uma semana para escrever a respeito no
sentido de aguardar comentários e mais detalhes sobre o ocorrido, principalmente
sobre a postura da polícia, dirigentes, Ministério Público, autoridades e a
sociedade em geral, para somente à partir daí emitir opinião.
Na ocasião já me manifestei através do facebook e do twitter (@MARLONTEZA) deixando
claro algumas posições, principalmente dos equívocos tanto da Polícia Militar
local quanto do Ministério Público também local. É bom salientar que tais
equívocos só não resultaram em mal maior por sorte ou interferência “divina”
(para aqueles que em Deus acreditam) tal a dimensão que os confrontos no
interior do estádio (arquibancadas) tomaram.
Já escrevi sobre isso neste blog em junho deste ano em artigo
intitulado COPA DO MUNDO DE 2014 – LEGADO NEGATIVO PARA A SEGURANÇA PÚBLICA
BRASILEIRA -http://marlonteza.blogspot.com.br/2013/06/copa-do-mundo-2014-legado-negativo-para.html
Como já mencionei uma série de equívocos, em meu entender, ocasionaram
os tristes episódios registrados pelas câmeras de televisão, imagens as quais rodaram
todo o mundo, e tentarei rapidamente discorrer nesta postagem.
Gostemos ou não o ESTATUTO DO TORCEDOR - Lei Federal 10.671/2003 - que
regula vários aspectos das competições desportivas no território nacional
(todas as competições não só o futebol), no que tange a segurança dos eventos,
dispõe o seguinte:
Art. 14. Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11
de setembro de 1990, a
responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade
de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes, que
deverão:
I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de eventos desportivos. (grifado)
Ora, quem
são os agentes públicos devidamente identificados?
São policiais militares, aqueles integrantes da Instituição Polícia
Militar que a Constituição Federal no § 5º do Artigo 144 menciona e remete a
missão de POLÍCIA OSTENSIVA e de PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA. Então fica muito
claro que é missão da Polícia Militar estar DENTRO E FORA desses locais visando
preservar a ordem pública.
Merece também, para melhor compreender a missão Constitucional da
Polícia Militar, um breve comentário sobre o que a doutrina dominante e já
aceita pelos tribunais tráz a respeito de Polícia Ostensiva e Preservação da
Ordem Pública:
POLÍCIA OSTENSIVA: é uma expressão nova, não só
no texto constitucional como na nomenclatura da
especialidade. Foi adotada por dois motivos: o primeiro, de estabelecer a exclusividade constitucional e,
o segundo, para marcar a expansão da
competência policial dos policiais militares,
além do "policiamento" ostensivo. Para bem entender esse
segundo aspecto, é mister ter presente
que o policiamento é apenas uma fase da atividade de polícia. A atuação do Estado, no
exercício de seu poder de polícia, se
desenvolve em quatro fases (que é delegada a Polícia Militar para ações
relacionadas a manutenção e preservação da ordem pública): a ordem de polícia,
o consentimento de polícia, a
fiscalização de polícia e a sanção de
polícia.
Isso quer
dizer que a Polícia Militar é a Instituição encarregada de todo o universo da
atividade, devendo tomar atitudes, antes, durante, a após o evento sem
necessidade de qualquer órgão coadjuvante para lhe dizer o que deve ou não
fazer, pois tudo isso nasce da sua missão Constitucional.
PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA: NOVA TERMINOLOGIA EM FACE A CF DE 1988 –
Firmou a diferença entre manutenção e preservação.
A
preservação da Ordem Pública dá-se em duas fases distintas: a primeira em
situação de normalidade, quando esta é assegurada por ações preventivas através
do exercício da Polícia Ostensiva (que é a principal e não confundir com
Policiamento Ostensivo); e a Segunda, em situação de anormalidade, ou seja, na
quebra da ordem pública, quando tem que ser restabelecida através de ações de
Polícia Ostensiva repressivas enérgicas e imediatas.
As Polícias
Militares constituem instituições de preservação da ordem pública para todo o universo da atividade
policial em tema da "ordem
pública" .
O QUE É ORDEM PÚBLICA: CONCEITO FORMAL (Decreto Federal 88.777/83) - Conjunto de regras
formais, que emanam do ordenamento
jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações sociais de todos os níveis do interesse
público, estabelecendo um clima de
convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo Poder de Polícia,
e constituindo uma situação ou condição
que conduza ao bem comum.
CONCEITO
DOUTRINÁRIO- Situação de normalidade que o Estado tem o dever de assegurar às instituições e todos os
membros de sua sociedade, consoante as normas jurídicas legalmente
estabelecidas. A ordem pública é sempre uma noção de valor,
composta pela segurança pública, tranqüilidade pública e salubridade pública.
Ela existe quando estão garantidos os direitos individuais, a estabilidade das
instituições, o regular funcionamento
dos serviços públicos e a moralidade pública. É a condição que conduz ao bem comum, sendo
variável no tempo e no espaço.
SEGURANÇA PÚBLICA - É o estado antidelitual que resulta na
inobservância dos preceitos tutelados pelos códigos penais comuns e pela lei
das contravenções penais com ações de polícia preventiva ou repressiva típicas,
afastando assim de todo o perigo ou de todo o mal que possa afetar a ordem
pública.
TRANQUILIDADE PÚBLICA – Exprime o estado de ânimo
tranqüilo, sossegado, sem preocupações nem incômodos. Que traz as pessoas uma
serenidade, uma paz de espírito. – É muito mais uma sensação
SALUBRIDADE PÚBLICA – Refere-se ao que é saudável
conforme as condições favoráveis de vida (saúde) inclusive as decorrentes de
calamidades públicas, a expressão salubridade pública designa também o estado
de sanidade e de higiene de um lugar, em razão do qual mostram-se propícias as
condições de vida de seus habitantes
Para melhor entender a PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA elaborei o seguinte quadro:
Então cabe a Polícia Militar tomar todas as medidas necessárias como
Polícia Ostensiva para evitar, a todo custo, que a Ordem Pública seja quebrada,
ou seja, preservá-la - manter e em caso de quebra restabelecê-la com ações de
polícia.
Tais ações de Policia Ostensiva independem de ordem superior, de ordem
política, de recomendações do Ministério Público ou intromissão de outro órgão
ou Instituição. A Polícia Militar em sua missão Constitucional é autônoma (como
ocorre com todas instituições com missão Constitucional) e somente se curvará
obedecendo ordem Judicial a qual deve ser cumprida, porém, mesmo assim cabe se
necessário o recurso legal aos tribunais superiores.
Então, mesmo sendo um evento privado há legislação regulando a
segurança deles, até porque a Polícia, no caso a Polícia Militar, deve estar
onde o risco da quebra da ordem é iminente, principalmente onde envolva a
integridade física das pessoas, independente do evento ser privado ou não. Nestes
casos ou a polícia realiza a preservação da ordem com a presença e tomada de
medidas saneadoras antes do evento, ou até, se for o caso, tome a medida de
impedir que o mesmo se realize.
Outra polêmica na segurança em competições desportivas é a presença ou
não de segurança privada. É evidente que é interessante e em muitos casos
necessária essa presença, no entanto, essa segurança privada deve estar
articulada e sob a coordenação da Polícia Ostensiva, e mais, sua atuação só é
cabível para preservar as regras do evento (campeonato) como: controle de
abertura de portões internos, retiradas de faixas e cartazes, controlar quem tem
acesso ao gramado de jogo, dentre outras, porém jamais suas ações poderão
recair sobre a pessoas, isso só a polícia pode realizar.
O episódio, no entanto, serviu e está servindo, para um debate Nacional
sobre o tema, inclusive se há necessidade de mudar as regras legais atuais ou
melhorá-la visando proporcionar mais condições para que a Polícia Militar
cumpra sua missão Constitucional.
Particularmente, levando em conta a educação, a cultura e a tradição do
povo brasileiro em eventos esportivos notadamente em jogos de futebol, aliado a
ignorância e interesses de dirigentes, tenho a impressão que levaremos décadas
para que a polícia adote posturas diferenciadas nestes eventos. Também, da
mesma maneira, sou levado a crer que as autoridades, legislativo e judiciário
por longo tempo ainda não terão interesse nem coragem para fazê-lo.
- O Brasil
ainda terá muitos anos pela frente antes que o povo tenha condições de estar
nos estádios e praças desportivas sem a presença da polícia;
- Autoridades
como o Ministério Público devem ter mais cuidado quando interfere em atividades
policiais regradas pela Constituição Federal, pois em se falando de atividade
de polícia não há lugar para “achismos”;
- Os
dirigentes de agremiações desportivas devem investir mais para que os locais
(ESTÁDIOS, ETC) onde se realizam eventos desportivos tenham mais condições físicas
para receber grande número de pessoas;
- A Polícia
Militar reconheceu acetadamente que sua atitude careceu de previsão legal e noticiou que está
redimencionado suas ações em eventos esportivos. Que o Ministério Público
procure fazer o mesmo;
- O sistema
punitivo da justiça (Justiça Comum e desportiva) deve agir com mais celeridade
e rigidez punindo torcedores criminosos, agremiações e seus dirigentes
inescrupulosos e que agem contra a lei; e
- Os fatos
ocorridos na arena Joinville durante o jogo de futebol entre Vasco e Atlético
Paranaense deve servir de exemplo a todos para que não ocorram mais.
Para finalizar é prudente que antes de se adotar medidas que possam
resultar em risco de vida às pessoas os dirigentes e as autoridades policiais ou
não, a sociedade, o Ministério Público e a própria Justiça procure observar e levar em
conta a legislação em vigor evitando assim catástrofes onde possam resultar em
prejuízo às pessoas. Que cada um cumpra a sua parte.
Aproveito para desejar à todos um FELIZ NATAL E UM PRÓSPERO ANO NOVO.
MARLON JORGE
TEZA
Mais uma aula aos esquecidos
ResponderExcluirParabéns pelas reflexões sobre este episódio que, infelizmente, demonstrou quão despreparados estamos. Precisamos, nós policiais-militares, ter mais coragem no enfrentamento de tais questões, cruciais para justificarmos nossa existência. O alerta deve ser levado a sério pelo universo policial-militar (Comandantes Gerais, Associações e Oficiais das PPMM). Não basta somente lutarmos por melhores vencimentos, melhores condições de trabalho, etc., se descurarmos de nossas missões básicas constitucionais.
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