segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

SEGURANÇA EM EVENTOS ESPORTIVOS - CASO ARENA JOINVILLE

Há uma semana todos assistimos o episódio ocorrido durante o jogo de futebol entre as equipes do vasco e do atlético paranaense realizado na conhecida Arena Joinville na cidade que leva o mesmo nome e válido pelo campeonato brasileiro da série A.
Resolvi esperar pelo menos uma semana para escrever a respeito no sentido de aguardar comentários e mais detalhes sobre o ocorrido, principalmente sobre a postura da polícia, dirigentes, Ministério Público, autoridades e a sociedade em geral, para somente à partir daí emitir opinião.
Na ocasião já me manifestei através do facebook e do twitter (@MARLONTEZA) deixando claro algumas posições, principalmente dos equívocos tanto da Polícia Militar local quanto do Ministério Público também local. É bom salientar que tais equívocos só não resultaram em mal maior por sorte ou interferência “divina” (para aqueles que em Deus acreditam) tal a dimensão que os confrontos no interior do estádio (arquibancadas) tomaram.
Já escrevi sobre isso neste blog em junho deste ano em artigo intitulado COPA DO MUNDO DE 2014 – LEGADO NEGATIVO PARA A SEGURANÇA PÚBLICA BRASILEIRA -http://marlonteza.blogspot.com.br/2013/06/copa-do-mundo-2014-legado-negativo-para.html
Como já mencionei uma série de equívocos, em meu entender, ocasionaram os tristes episódios registrados pelas câmeras de televisão, imagens as quais rodaram todo o mundo, e tentarei rapidamente discorrer nesta postagem.
Gostemos ou não o ESTATUTO DO TORCEDOR - Lei Federal 10.671/2003 - que regula vários aspectos das competições desportivas no território nacional (todas as competições não só o futebol), no que tange a segurança dos eventos, dispõe o seguinte:
Art. 14. Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes, que deverão:

I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de eventos desportivos.
(grifado)
Ora, quem são os agentes públicos devidamente identificados?
São policiais militares, aqueles integrantes da Instituição Polícia Militar que a Constituição Federal no § 5º do Artigo 144 menciona e remete a missão de POLÍCIA OSTENSIVA e de PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA. Então fica muito claro que é missão da Polícia Militar estar DENTRO E FORA desses locais visando preservar a ordem pública.
Merece também, para melhor compreender a missão Constitucional da Polícia Militar, um breve comentário sobre o que a doutrina dominante e já aceita pelos tribunais tráz a respeito de Polícia Ostensiva e Preservação da Ordem Pública:
POLÍCIA OSTENSIVA: é uma expressão  nova, não só no texto constitucional como na nomenclatura da  especialidade. Foi adotada por dois motivos: o primeiro, de  estabelecer a exclusividade constitucional e, o segundo, para  marcar a expansão da competência policial dos policiais militares,  além do "policiamento" ostensivo. Para bem entender esse segundo aspecto, é mister ter presente  que o policiamento é apenas uma fase da atividade de  polícia. A atuação do Estado, no exercício de seu poder de  polícia, se desenvolve em quatro fases (que é delegada a Polícia Militar para ações relacionadas a manutenção e preservação da ordem pública): a ordem de polícia, o  consentimento de polícia, a fiscalização de polícia e a  sanção de polícia.
Isso quer dizer que a Polícia Militar é a Instituição encarregada de todo o universo da atividade, devendo tomar atitudes, antes, durante, a após o evento sem necessidade de qualquer órgão coadjuvante para lhe dizer o que deve ou não fazer, pois tudo isso nasce da sua missão Constitucional.
PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA: NOVA TERMINOLOGIA EM FACE A CF DE 1988 – Firmou a diferença entre manutenção e preservação.
A preservação da Ordem Pública dá-se em duas fases distintas: a primeira em situação de normalidade, quando esta é assegurada por ações preventivas através do exercício da Polícia Ostensiva (que é a principal e não confundir com Policiamento Ostensivo); e a Segunda, em situação de anormalidade, ou seja, na quebra da ordem pública, quando tem que ser restabelecida através de ações de Polícia Ostensiva repressivas enérgicas e imediatas.
As Polícias Militares constituem instituições de preservação da ordem  pública para todo o universo da atividade policial em tema da  "ordem pública" .
O QUE É ORDEM PÚBLICA: CONCEITO FORMAL (Decreto Federal 88.777/83) - Conjunto de regras formais, que  emanam do ordenamento jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações  sociais de todos os níveis do interesse público, estabelecendo um clima de  convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo Poder de Polícia, e  constituindo uma situação ou condição que conduza ao bem  comum.
CONCEITO DOUTRINÁRIO- Situação de normalidade que o Estado tem o  dever de assegurar às instituições e todos os membros de sua sociedade, consoante as normas jurídicas legalmente estabelecidas.  A  ordem pública é sempre uma noção de valor, composta pela segurança pública, tranqüilidade pública e salubridade pública. Ela existe quando estão garantidos os direitos individuais, a estabilidade das instituições, o regular funcionamento  dos serviços públicos e a moralidade pública. É a  condição que conduz ao bem comum, sendo variável no tempo e no espaço.
SEGURANÇA PÚBLICA -  É o estado antidelitual que resulta na inobservância dos preceitos tutelados pelos códigos penais comuns e pela lei das contravenções penais com ações de polícia preventiva ou repressiva típicas, afastando assim de todo o perigo ou de todo o mal que possa afetar a ordem pública.
TRANQUILIDADE PÚBLICA – Exprime o estado de ânimo tranqüilo, sossegado, sem preocupações nem incômodos. Que traz as pessoas uma serenidade, uma paz de espírito. – É muito mais uma sensação
SALUBRIDADE PÚBLICA – Refere-se ao que é saudável conforme as condições favoráveis de vida (saúde) inclusive as decorrentes de calamidades públicas, a expressão salubridade pública designa também o estado de sanidade e de higiene de um lugar, em razão do qual mostram-se propícias as condições de vida de seus habitantes
Para melhor entender a PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA elaborei o seguinte quadro:

 Então cabe a Polícia Militar tomar todas as medidas necessárias como Polícia Ostensiva para evitar, a todo custo, que a Ordem Pública seja quebrada, ou seja, preservá-la - manter e em caso de quebra restabelecê-la com ações de polícia.
Tais ações de Policia Ostensiva independem de ordem superior, de ordem política, de recomendações do Ministério Público ou intromissão de outro órgão ou Instituição. A Polícia Militar em sua missão Constitucional é autônoma (como ocorre com todas instituições com missão Constitucional) e somente se curvará obedecendo ordem Judicial a qual deve ser cumprida, porém, mesmo assim cabe se necessário o recurso legal aos tribunais superiores.
Então, mesmo sendo um evento privado há legislação regulando a segurança deles, até porque a Polícia, no caso a Polícia Militar, deve estar onde o risco da quebra da ordem é iminente, principalmente onde envolva a integridade física das pessoas, independente do evento ser privado ou não. Nestes casos ou a polícia realiza a preservação da ordem com a presença e tomada de medidas saneadoras antes do evento, ou até, se for o caso, tome a medida de impedir que o mesmo se realize.
Outra polêmica na segurança em competições desportivas é a presença ou não de segurança privada. É evidente que é interessante e em muitos casos necessária essa presença, no entanto, essa segurança privada deve estar articulada e sob a coordenação da Polícia Ostensiva, e mais, sua atuação só é cabível para preservar as regras do evento (campeonato) como: controle de abertura de portões internos, retiradas de faixas e cartazes, controlar quem tem acesso ao gramado de jogo, dentre outras, porém jamais suas ações poderão recair sobre a pessoas, isso só a polícia pode realizar.
O episódio, no entanto, serviu e está servindo, para um debate Nacional sobre o tema, inclusive se há necessidade de mudar as regras legais atuais ou melhorá-la visando proporcionar mais condições para que a Polícia Militar cumpra sua missão Constitucional.
Particularmente, levando em conta a educação, a cultura e a tradição do povo brasileiro em eventos esportivos notadamente em jogos de futebol, aliado a ignorância e interesses de dirigentes, tenho a impressão que levaremos décadas para que a polícia adote posturas diferenciadas nestes eventos. Também, da mesma maneira, sou levado a crer que as autoridades, legislativo e judiciário por longo tempo ainda não terão interesse nem coragem para fazê-lo.
Vários ensinamento e reflexões ficaram:
- A Polícia Militar é necessária em todos os eventos que haja presença massiva de pessoas;
- O Brasil ainda terá muitos anos pela frente antes que o povo tenha condições de estar nos estádios e praças desportivas sem a presença da polícia;
- Autoridades como o Ministério Público devem ter mais cuidado quando interfere em atividades policiais regradas pela Constituição Federal, pois em se falando de atividade de polícia não há lugar para “achismos”;
- Os dirigentes de agremiações desportivas devem investir mais para que os locais (ESTÁDIOS, ETC) onde se realizam eventos desportivos tenham mais condições físicas para receber grande número de pessoas;
- A Polícia Militar reconheceu acetadamente que sua atitude careceu de previsão legal e noticiou que está redimencionado suas ações em eventos esportivos. Que o Ministério Público procure fazer o mesmo;
- O sistema punitivo da justiça (Justiça Comum e desportiva) deve agir com mais celeridade e rigidez punindo torcedores criminosos, agremiações e seus dirigentes inescrupulosos e que agem contra a lei; e
- Os fatos ocorridos na arena Joinville durante o jogo de futebol entre Vasco e Atlético Paranaense deve servir de exemplo a todos para que não ocorram mais.
Para finalizar é prudente que antes de se adotar medidas que possam resultar em risco de vida às pessoas os dirigentes e as autoridades policiais ou não, a sociedade, o Ministério Público e a própria Justiça procure observar e levar em conta a legislação em vigor evitando assim catástrofes onde possam resultar em prejuízo às pessoas. Que cada um cumpra a sua parte.
Aproveito para desejar à todos um FELIZ NATAL E UM PRÓSPERO ANO NOVO.

MARLON JORGE TEZA

2 comentários:

  1. Parabéns pelas reflexões sobre este episódio que, infelizmente, demonstrou quão despreparados estamos. Precisamos, nós policiais-militares, ter mais coragem no enfrentamento de tais questões, cruciais para justificarmos nossa existência. O alerta deve ser levado a sério pelo universo policial-militar (Comandantes Gerais, Associações e Oficiais das PPMM). Não basta somente lutarmos por melhores vencimentos, melhores condições de trabalho, etc., se descurarmos de nossas missões básicas constitucionais.

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